A psicologia e os processos colonizadores
Os processos de colonização e os possíveis impactos na psicologia da atualidade
Por Everaldo Lauirtzen Lucena Filho e Isis Lima da Silva - (Universidade Federal do Sul da Bahia)
Resumo
O objetivo do presente artigo é apresentar algumas contribuições dos estudos pós-coloniais e decoloniais sobre a Psicologia como Ciência Humana por meio de revisão bibliográfica em publicações relacionadas a tais discussões. Elencamos os processos violentos de colonização como a chegada do homem branco, a constituição da subalternidade e as decorrências que reverberam nas práticas cotidianas, atingindo a produção de epistemologias. Tomando como premissa de que há no conhecimento um lugar de enunciação, imbricado nas relações hegemônicas e subalternas, podemos perceber que a neutralidade do conhecimento é ilusória. Na revisão de literatura os autores utilizados realizam críticas contundentes às produções do mundo dito ocidental e possibilitaram a compreensão de que a Psicologia ou as Psicologias são marcadas por ontologias forjadas no continente que estabeleceu relações de colonização com os povos oprimidos. Assim, fica claro a necessidade de reflexão sobre possíveis efeitos e impactos epistemológicos do processo de colonização na Psicologia e nas práticas profissionais.
1. SOBRE A COLONIZAÇÃO
Em busca da compreensão de como a Psicologia, área de produção de saber, se apresenta no Brasil como ciência e profissão, precisamos refletir inicialmente sobre como se deu a chegada dos europeus, suas ideias e suas teorias no novo continente.
Para analisarmos os objetivos e impactos da chegada do povo europeu nas Américas, podemos utilizar como dispositivo inicial de reflexão as ideias de Aimé Césaire (1978), através das quais podemos analisar os processos violentos da chegada dos europeus e de suas intenções colonizadoras.
Podemos supor que o processo de colonização permitiu o intercâmbio cultural e de energia, mas Césarie (1978) questiona se essa colonização trouxe realmente civilização e aponta que existe uma distância da colonização para a civilização. Aparentemente o autor quer colocar que colonizar um povo, não quer dizer civilizá-lo e que esta troca cultural é falsa, já que uma cultura continua dominante e, definitivamente, não é a cultura do colonizado.
Césaire (1978), aponta ainda para a colonização, marcada por um propósito econômico e comercial, na busca pelo ouro, através da utilização da força, e com essa caraterização da colonização denuncia o engodo do propósito civilizatório forjado no mundo europeu.
A partir de estabelecimento de critérios ocidentais o cristianismo passa a ser associado à civilização e os povos pagãos aos selvagens, tendo como vítimas os índios, amarelos e os negros. Camuflando suas intenções, o homem conquistador lança-se então ao mar para levar civilização aos selvagens, sem perceber que tal processo civilizatório o faria descivilizado, segundo Césarie (1978).
Segundo o autor, os colonizadores conseguem justificar um cenário de violência e desrespeito como condição para o processo de civilização que se fez necessária para atingir os objetivos, que como já citado, eram econômicos e de dominação, mas travestidos em melhorar a qualidade de vida dos colonizados, “trazer” algo de bom para estes povos, mesmo que fosse pela via da violência.
Césaire (1978) afirma que ninguém coloniza o outro de forma inocente, há sempre uma justificativa para subjugar o outro e quem o faz já é uma civilização adoecida, bem como ao colonizar, cai numa negação da própria civilização, pois ao dominar o outro este se desciviliza.
Surge então o questionamento do que foi levado para os países colonizados: Segurança? Cultura? Juridismo? O autor adianta que o produto do processo de colonização, no encontro entre colonizador e colonizado, é a força e a formação de subalternos, indo adiante, propõe que não é um encontro humano, mas uma relação que coloca o outro como criado, como instrumento de produção, gerando a equação: colonização=coisificação. Temos como produtos dessa colonização culturas dizimadas, confisco de terras, crenças assassinadas, produções artísticas desaparecidas, “extraordinárias possibilidades suprimidas” (Césaire, 1978, pg 25).
Às voltas com inquietudes similares sobre os feitos e efeitos da colonização, Frantz Fanon (1961) sinaliza um outro aspecto dessa discussão não circunscrita pelo primeiro autor. Aponta Fanon, na mesma obra, para o processo de desumanização do colonizado pelo discurso do colono.
Tudo isso é resultado das investidas do povo europeu que são decididamente norteadas por suas produções e reproduções de discursos, ancorados em ideiais de conhecimento que dão sustentação a odisseia da propagação de civilização e produção do progresso.
Acontece que o pensamento colonizador, não desaparece com o fim das colônias, faz eco e ganha novas nuances em suas reverberações para a sustentação do discurso e do ethos da colonização.
As reverberações advindas da colonização perpassam as práticas cotidianas e atingem a produção de epistemologias. Alerta-nos Grosfoguel (2008) que há no conhecimento um lugar de enunciação, ecoado a partir do lugar de hegemonia ou da subalternidade que ele chama de geopolítica e a corpo-política do conhecimento. Assim, a neutralidade do conhecimento é ilusória.
Na tentativa de advogar tal ideia vemos como marco a discussão da separação do corpo e da mente, Descartes proclama um enunciado não situado e universal que marcará a filosofia ocidental como egopolítica, onde ocultado o lugar do sujeito que enuncia o conhecimento produzirá uma hierarquia como superior e inferior (GROSFOGUEL, 2008).
O conhecimento enunciado ocidental tido como universal captura os sujeitos das regiões problemas sob a imagem do subdesenvolvido, atrasado, alvo justificado de intervenções civilizatórias. É sob essa lógica perversa e colonial que vemos a cumplicidade entre as ciências humanas e sociais ocidentais e a colonialidade do poder revelada na produção de conhecimento.
2. PSICOLOGIA COLONIAL
Na tentativa de compreender as críticas postas à construção de conhecimentos e discursos no continente europeu, abstrusa pela egopolítica, podemos citar novamente Césaire (1978) que reflete sobre algumas construções analíticas da Psicologia, especificamente utilizando o autor Mannoni. Refletindo sobre um escrito de Mannoni a respeito do povo Malgaxe, esse os caracteriza como povos que têm necessidade de dependência, que não conseguem fazer o rito de passagem de separação dos pais, pleiteada, segundo ele, por todos os jovens europeus, essa necessidade de se igualar aos pais. Os malgaxe ignoram a rivalidade com o pai e não deseja autonomia nem livre responsabilidade.
Parece que Manonni, de acordo Césaire (1978), tenta evidenciar que nessas culturas, especificamente os Malgaxe tem um desejo por ser dominado, que este povo não deseja a autonomia, o que sugere um contrassenso, visto que este povo se rebelou várias vezes. Aparentemente o autor em questão, confunde vivências mais comunitárias e familiares, com mecanismos de dependências. Vemos a tentativa de retirada do desejo destes povos ou mais ainda, a sua colocação como desejantes pela subordinação.
As explicações advindas da compreensão de Manoni apontam para uma ciência da subjetividade que explicará o comportamento de todos a partir dos ideiais eurocêntricos.
Mas de qual Psicologia estamos falando? Bock, Teixera e Furtado (2001), caracterizam essa como ciência que contribui para o entendimento da subjetividade, conceituada, por sua vez, como: "O homem em todas as suas expressões, as visíveis (nosso comportamento) e as invisíveis (nossos sentimentos), as singulares (porque somos o que somos) e as genéricas (porque somos todos assim) — é o homem-corpo, homem-pensamento, homem-afeto, homem-ação e tudo isso está sintetizado no termo subjetividade (pg. 28)"
Filha da filosofia europeia, a Psicologia Científica Moderna tem em Liebnitz com Wilhem Wundt em 1879 seu marco histórico. Porém tal ciência será constituída pela falta de unidade teórico-metodológica, como nos exorta Patto (1984). Tal característica possibilita uma série de orientações epistemológicas, as mais diversas, mas, ainda de acordo com a autora acima citada, no geral as pesquisas tendem a repetir velhos paradigmas nessa ciência, todos nascidos no berço da civilização ocidental. A Psicologia ou as Psicologias então desses últimos 138 anos foram marcadas pelas ontologias forjadas no continente que estabeleceu, há bem mais que 138 anos com o resto do globo terrestre, relações de colonização.
A partir dessas primeiras reflexões podemos pensar que a Psicologia até hoje discutida, feita e refletida terá seus fundamentos na Europa e tal constituição não sairá ilesa na forma como essa propõe reflexões sobre a subjetividade. Podemos pensar que há então a possibilidade de existência de uma psicologia colonial. Especialmente quando comungamos da perspectiva de que é no movimento colonial e na revolução industrial que o capitalismo tem a sua aurora.
Patto (1984), às voltas com as imbricações entre as ideologias e as práticas psicológicas e com as implicações de tais relações, afirma que a Psicologia para ser reconhecida como discurso científico ratificou muitas expectativas capitalistas, servindo ao propósito de manutenção de relações marcadas pelo discurso ideológico burguês. Dessa maneira se deu na Europa, não diferente se deu no Brasil.
A partir dessas ponderações a noção de uma Psicologia marcada pela colonialidade se solidifica a partir de ideais capitalistas. Para compreendermos o que deve ser levado em consideração na tentativa de responder a indagação do presente ensaio, torna-se necessário pensarmos quais marcas o sistema colonial produziu e quais estigmas ainda permanecem e podem estar enviesando a Psicologia na sua forma de apreender as subjetividades, especialmente as vividas nos países periféricos sob a égide da colonialidade.
Tal posição política vai sendo justificada pela produção científica. De acordo com Césaire (1978) psicólogos e sociólogos, através da construção “científica” de primitivismo, forjam uma imagem na qual são coladas as nações não europeias. Os povos não brancos vão sendo através da Psicologia, completamente influenciada pela ideologia do capital, classificados como tendo necessidade de dependência, como já exortado anteriormente.
Tal postura, de acordo com Aimé Cesárie (1978), condena o pensamento europeu pela morte de civilizações e pela destruição de nacionalidades. As diversidades existentes em países não brancos são dizimadas, saberes são extirpados em nome do uma civilização forjada pelo homem europeu e não sustentada em seu próprio discurso. O povo europeu promoveu genocídio de subjetividades, e se psicólogos participaram dessa construção de pensamento é porque houve e, possivelmente, há uma psicologia colonial, comprometida com os ideais da civilização branca europeia. É válido pontuar que apesar de todos esses esforços colonizadores tais povos, tais etnias, tais subjetividades não cansam de resistir e de novas estratégias engendrar.
3. ÍNFIMAS CONSIDERAÇÕES E ALGUMAS POSSIBILIDADES
Refletindo um pouco mais sobre o processo de descolonização, como consequência de um momento no qual povos tiveram seus direitos retirados, como trabalhado no texto acima a partir do olhar de Cesaire (1978), buscaremos discutir esta descolonização enquanto uma construção violenta à luz do texto de Frantz Fanon.
Guimarães (2017) nos fala que Frantz Fanon é um autor central de estudos culturais, pós-coloniais e afro-americanos e que é valorizado no Brasil, principalmente por estudiosos negros, mas somente a partir da década de 60 surge escritos sobre ele neste país. O texto de Fanon (1961) “Os condenados da Terra” afirma que a descolonização é um processo violento, uma substituição de algo existente por algo completamente novo, com a reivindicação, mesmo que pequena, do colonizado. Para ser efetuada tal mudança necessita ser desejada, exigida, pois ela não é simplesmente dada pelo colonizador.
A descolonização, segundo o autor, não é uma construção mágica, mas um processo histórico, tendo a violência como seu primeiro movimento de confrontação em relação à exploração do colonizado pelo colono, lembrando que é da relação colonial que o colono tira seus bens e se mantém.
Para Fanon (1961), não é possível que a descolonização aconteça de forma alheia, pois ela modifica o ser, transformado espectadores em atores, trazendo uma dinâmica própria ao sujeito, ou seja, é o próprio colonizado que vai construindo os caminhos de libertação e como afirma o autor, “toda descolonização é um triunfo.” (Fanon, pg. 27). O autor propõe o mundo como dividido em duas partes e nas colônias quem tem o poder é o soldado, nas sociedades capitalistas o ensino potencializa o respeito a ordem em vigor, formando um ambiente de submissão, tornando a pressão dos dominadores mais fácil de ser imposta. Já nos lugares coloniais esta força é imediata, direta e cercada de violência, o exercício direto da força para a obtenção da ordem.
O mundo do colonizado e do colono, para Fanon (1961), não são lugares que se complementam, são lugares antagônicos e habitados por espécies diferentes, não bastando ao colono restringir o espaço do colonizado, mas colocar a sociedade colonizada como sem importância, um povo sem moral, com valores deturpados, claramente com o intuito de descredenciar o povo colonizado, como alguém que não tem condição de gerenciar os espaços sociais.
A partir da compreensão das malhas que tecem os discursos políticos e científicos próprios do sistema colonial e das práticas sustentadas por esses enunciados, a necessidade de mudança paradigmática parece ser tornar uma via de transmutação da percepção e da representação do homem não branco a partir de um discurso, de um conhecimento, de uma epistemologia não branca, não colonial.
Grosfoguel (2008) apela para a necessidade de transcender a epistemologia e o cânone ocidentais. Ele afirma que precisamos nos colocar numa perspectiva crítica ao que ele chama de fundamentalismo, caracterizado como única tradição epistêmica pela qual se poderia chegar a Verdade e a Universalidade e da qual brotaria o conhecimento confiável. Aponta ele que a produção das ciências do mundo ocidental e a sua filosofia é marcada pelo paradigma do sistema-mundo patriarcal/capitalista/colonial/moderno que se forja universalista, neutro e objetivo.
Como enfrentamento ao saber da colonialidade Grosfolguel, (2008) apela à proposta epistêmica de Mignolo (2000) chamada de “pensamento crítico de fronteira”. Tal posição epistêmica é um revide ao projeto eurocêntrico moderno. Busca tal pensamento rediscutir o discurso emancipatório da modernidade a partir dos conhecimentos dos periféricos, dos explorados, dos sujeitos da colônia visando a superação de tal discurso. Não se trata a epistemologia de fronteira de um movimento antimoderno, mas uma superação da construção conceitual de tal modernidade.
É interessante pensar que o colonizado não quer fazer um acordo de boa convivência com os colonos e muito menos apreenderem sua cultura, o que interessa as populações invadidas pela cultura europeia é a posse da sua terra e do direito de existir nela, sem a presença do colono, não é uma vivência pacífica que o os povos violentados querem, mas a devolução total de sua liberdade.
Corroborando o citado acima, ao falar da relação que o colonizado desenvolve com o colono no processo de descolonização, Fanon (1961) diz: "Então o colonizado descobre que sua vida, sua, respiração, as pulsações de seu coração são as mesmas do colono. Descobre que uma pele de colono não vale mais do que uma pele indígena. Essa descoberta introduz abalo essencial no mundo. Dela decorre toda a nova e revolucionária segurança do colonizado. Se, com efeito, minha vida tem o mesmo peso que a do colono, seu olhar não me fulmina, não me imobiliza mais, sua voz já não me petrifica. Não me perturbo mais em sua presença. Na verdade: eu o contrário. Não somente sua presença deixa de me intimidar como também já estou pronto para lhe preparar tais emboscadas que dentro de pouco tempo não terá outra saída senão a fuga.(Fanon, 1968, pg. 34)"
Para Fanon (1961), o intelectual colonizado aprende e advoga que o indivíduo deve afirmar-se, ou seja, cada sujeito deve se construir na sua subjetividade, o que não corresponde uma realidade, visto que teorias academicistas e individualizadoras não respondem as demandas de um povo usurpado dos seus direitos. O grito, o levante deve ser popular, numa perspectiva de libertação de todos, mas o intelectual colonizado, no contato com o povo, tem a possibilidade de se desarmar e não mais reproduzir o discurso do opressor.
Fanon (1961) ainda propõe que durante o período colonial, luta-se pela libertação nacional, após esta conquista luta-se pelo acesso à saúde, educação, contra a miséria, chegando à conclusão que viver é esta sempre em combate. Vemos uma reflexão interessante sobre os processos de dominação, mas há tentativas de mudança desta realidade, onde o colonizado não se encontra somente em posição passiva, existe uma intenção do colonizado de expulsar os colonos, de restituição de uma vida livre da feroz influência europeia e que o colonizado não sonha em conviver com o seus colonizadores. Esta descolonização não será pacífica, pois este processo de colonização foi extremamente violento e sem intenção de devolução de direitos. Portanto, para a restituição destes direitos a violência entre em cena como o processo para tal.
Estas leituras trazem provocações sobre as responsabilidades dos europeus no processo de dominação de povos, como esta foi violenta, como os direitos foram roubados e ainda o são, percebe-se que este processo de colonização ainda não acabou. Nós somos povos colonizados.
Outra discussão importante é o processo violento da descolonização. Césarie (1978) sinaliza a importância da união dos povos que tiveram seus direitos expropriados, o Fanon (1961) também, mas enfatiza as organizações de massa e a utilização da luta, da força e da violência para o processo de retomada da terra e dos direitos. Sem dúvida duas leituras salutares para uma reflexão dos mecanismos de dominação, mas também para pensar os mecanismos de resistência.
O questionamento central do movimento decolonial surge como uma estratégia necessária para o conhecimento aprofundado dos povos das américas que constantemente tem sido representados pelo discurso do homem branco europeu. O pensamento de fronteira parece se configurar como uma vicissitude de aproximação do subalterno à sua própria história vista, perlaborada e representada a partir de novos parâmetros e novas perspectivas. Olhar para si sem o véu, tecido pelo discurso preconceituoso europeu, que encobre nossas identidades, perceber-nos mediante a retirada da venda tramada pelas epistemologias do ocidente e imposta o seu uso através do sistema mundo pode ser a base, a estrutura e objetivo maior do pensamento crítico de fronteira. Talvez, arriscamos dizer que pode ser a base para uma psicologia para além da colonial.
A colonialidade do saber esta relacionada com a colonialidade do ser, ao que é da ordem do ontológico. É na imbricação da produção de saber sobre o ser que a Psicologia pode se posicionar e produzir conhecimento colonial ou para além dele.
Mediante a juventude da ciência psicológica, os efeitos sócio-históricos e suas confluências ideológicas são sentidas nas produções acadêmicas sobre o fazer psi. A Psicologia como ciência que tem como objeto de estudo a subjetividade não pode se furtar das provocações realizadas por outras áreas de produção de saber que também tomam o homem como objeto de estudo. É no reconhecimento do contributo dos estudos pós-coloniais e das elucubrações decoloniais que uma Psicologia dos periféricos e subalternos pode ganhar sentido e direção, utilizando da construção dos que foram atingidos pela civilização europeia, impactados pela violência do sistema mundo, que uma ciência próxima das subjetividades do sul pode se concretizar.
Entender o sujeito demanda compreender suas heranças coloniais e a colonialidade do saber, a colonialidade do apreender o sujeito, de discutir diversidade e subjetivação, como afirmam Alcantara, Serra e Miranda (2016) quando discute sobre a possibilidade de produção em Psicologia sob a perspectiva decolonial.
Múltiplos são os impactos promovidos pela colonialidade na produção da subjetividade e isso interessa a Psicologia, colonial ou não. Infinitos são os conflitos que a prática de uma Psicologia marcada pela colonialidade pode produzir na subjetividade dos sujeitos subalternos e isso interessa a Psicologia. Mas com certezas muito maior são as possibilidades da Psicologia se aproximar dos saberes dos subalternos para compreender como suas subjetividades são por elas sustentadas. Contudo, isso pode não interessar a Psicologia, especialmente se ela não for para além de sua epistemologia colonial.
Pode-se concluir então a partir dos textos e das provocações acima citadas que o processo de colonização parece ainda produzir efeitos, com novas nuances, na forma como os povos periféricos são compreendidos e apreendidos, assim podemos afirmar que ecos de tal colonização reverberam também em teorias da Psicologia e em práticas profissionais de psicólogos, que sem questionar-se sobre as origens ontológicas de suas posições epistemológicas podem estar promovendo uma psicologia colonial.
REFERÊNCIAS
Alcântara, R.L.S. Serra, E.O. & Miranda, O.A. O QUE EU FALO, O QUE EU FAÇO, O QUE EU SOU: colonialidade do saber, do poder e do ser como perspectiva analítica das questões étnico-raciais no Brasil. In: VIII Jornada Internacional de Políticas Públicas, 2017.
Bock, A.M.B.; Furtado, O; Teixeira, Psicologias: Uma Introdução ao Estudo da Psicologia. São Paulo: Saraiva, 2003;
Césarie, A. Discurso sobre o colonialismo, 1ª Ed. Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 1978.
Fanon, F. Os condenados da Terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1961;
Grofoguel, R. “Para descolonizar os estudos de economia política e os estudos póscoloniais: transmodernidade, pensamento de fronteira e colonialidade global”. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 80, p. 115-147, 2008.
GUIMARÃES, A.S.A. Racismo e anti-racismo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora 34, 2017. Mignolo, Walter (2000), Local Histories/Global Designs: Essays on the Coloniality of Power, Subaltern Knowledges and Border Thinking. Princeton: Princeton University.
Patto, M.H.S. Psicologia e Ideologia: uma introdução crítica à Psicologia Escolar. São Paulo: T.A.Queiroz, 1987.
Fonte: https://revistas.cesmac.edu.br/index.php/psicologia/article/view/857/710