Fanon e a esfera psicológica da dominação colonial

 

Racismo e Dominação Psíquica em Frantz Fanon 

Por Thiago C. Sapede[1] 

Este trabalho pretende explorar as ideias do psiquiatra Frantz Fanon sobre o colonialismo, focando-se na esfera psicológica da dominação colonial. Este autor enxerga o racismo como elemento central, operador psíquico da dualidade entre colono e colonizador, branco e negro, no colonialismo. Esse sistema profundo e complexo será observado como alicerce fundamental para a empreitada colonial e a manutenção da dominação europeia sobre “outros” povos. Esta discussão será importante para compreensão do racismo como elemento fundante do processo histórico de construção do ocidente.

Frantz Fanon nasceu em 1925, na ilha da Martinica, colônia francesa desde o século XVII. Era uma ilha povoada majoritariamente por descendentes de africanos escravizados. Aos dezoito anos, Fanon alistou-se no exército francês durante a segunda guerra mundial, lutando no norte da África. Após o fim da guerra, partiu para a França, buscando estudar medicina em Lyon. Fanon recebeu diversas influências intelectuais em sua temporada na França. Dialogou intensamente com o movimento da Negritude, sobretudo com seu conterrâneo Aimé Cesaire e o senegalês S. Senghor. Sua interlocução com Jean-Paul Sartre foi também relevante. Recebeu influência decisiva teórica da psicanálise, muito em voga na França no período, com os seminários de Jacques Lacan. Logo após formar-se em psiquiatria foi trabalhar na Argélia, onde se tornou importante ativista na luta de libertação argelina.

Seus trabalhos fundamentais foram “Pele Negra, Máscaras Brancas”, de 1952 – que escreveu inicialmente como tese para habilitar-se em psiquiatria, mas foi recusado -, e “Os condenados da Terra” de 1961[2]. Abordarei aqui uma das facetas do trabalho de Fanon sobre o colonialismo: a esfera psicológica, dando ênfase à questão do racismo. “Pele Negra, Mascaras Brancas” será nossa principal fonte, pois dialoga mais intensamente com os objetivos desta pesquisa.

Tratarei inicialmente da conceituação de Fanon do termo racismo, feita através do debate com outro psiquiatra estudioso das relações coloniais, Octave Manonni.

Manonni abordou o racismo colonial como uma atitude de indivíduos ou classes específicas. Estudando o caso da África do sul, afirmou que o proletariado branco (que competia por trabalho com africanos diariamente) assumia uma postura muito mais racista do que a elite colonial. Defendeu assim a possibilidade de existirem diversos “graus” de racismo, dependendo do tipo de exploração e da cultura local. Em Manonni, o “racismo” aparece numa concepção mais elástica e superficial, vinculado às atitudes discriminatórias que nascem da “cultura” de uma classe social ou de um povo. O tipo de exploração colonial, para ele, portanto, difere dos outros tipos de exploração. Assim como o racismo colonial não se equivale a outras formas de racismo[3].

A partir das críticas às ideias deste autor, Fanon coloca-se num polo oposto. Para ele, o proletariado branco da África do Sul é racista não por uma especificidade cotidiana ou cultural, mas pelo fato do racismo existir como elemento estrutural na sociedade sul-africana. Tratar-se-ia de uma estrutura muito profunda, que envolve as esferas econômica, social e psicológica. Dentro dessa concepção, uma sociedade que é racista é racista por inteiro, não dependendo dos setores sociais ou culturais nos quais a discriminação emergirá com mais evidência. As atitudes de discriminação diretas são apenas sintomas de um sistema muito mais profundo.

Para Fanon, portanto, aqueles que assumem uma atitude discriminatória não são necessariamente mais racistas do que àqueles que assumem o papel de cumplices passivos dessas ações. A discriminação direta seria apenas a “ponta do iceberg”.

Essas idéias apresentada por Fanon como contraponto a Manonni, não foram inéditas quando apresentadas. Ele recebeu influência significativa das discussões sobre o racismo feitas por Sartre, que tratou profundamente do antissemitismo europeu em Reflexões sobre o racismo. Afinal, Sartre já trazia, ali, a noção de racismo como fato estrutural da sociedade. Veremos que a novidade em Fanon será levar esta tese sartriana para o campo psicológico e para a sociedade colonial.

O autor, após desmontar as ideias de Manonni, apresenta seu ponto de partida, bastante incisivo: “Dizíamos a pouco que a África do Sul tem uma estrutura racista. Agora vamos mais longe, dizendo que a Europa tem uma estrutura racista”[4].

Apoia esta afirmação no fato do europeu ter no inconsciente da coletividadeo que chama de “complexo de autoridade”. Ou seja, a ideia de si mesmo como um tipo superior de homem.

Fanon diz:

“Há na Martinica duzentos brancos que se julgam superiores a trezentos mil elementos de cor. Na África do Sul devem existir dois milhões de brancos para aproximadamente treze milhões de nativos, e nunca passou pela cabeça de nenhum nativo sentir-se superior a nenhum branco.”[5]

Através do complexo de autoridade, justifica-se a sujeição de outros grupos humanos, nascendo também a necessidade de classificação e hierarquização dos mesmos em “raças” ou etnias. A partir desta demanda, segundo Fanon, é criada a idéia do “negro”, pela dicotomia com o branco. Afirma que: “Precisamos ter a coragem de dizer: é o racista que cria o inferiorizado”.[6]

Apesar de Fanon não tratar dessa invenção do negro na temporalidade histórica, ele parece abordá-la no contexto da colonização da era industrial. Sabemos, porém,que desde finais do século XV, nos primeiros contatos de portugueses com populações africanas na costa atlântica, os europeus já se referiam aos africanos como pretos ou negros. A questão central é que esta “marca” não ocupava a posição central, que ganhoua partir do século XIX.

A expansão européia do início da época moderna tinha na raiz de seu discurso de legitimidade a salvação das almas e a expansão da fé. Nesta argumentação era Deus o legítimo senhor de todas as terras do mundo e responsável por todas as almas. A Igreja e o papa eram os legítimos representantes de Deus. Por isso, a eles cabia decidir o futuro dos gentios e hereges do Novo Mundo. A tutela dessas almas foi oferecida às monarquias ibéricas, que, explorando seus corpos, lhes ofereceriam a vida eterna.

Após uma época de intensas mudanças históricas e culturais, o homem europeu supôs-se racional. Os estados tornaram-se laicos, e a civilização passou a ocupar o valor máximo em lugar da salvação. A hierarquia entre as sociedades, que tinha como critério o plano divino, passou ao próprio corpo e à cultura. Nesse movimento, o europeu se desvinculou de Deus e se tornou ele próprio um semi-deus entre os homens.

Voltando à Fanon, notamos que a partir da relação de sujeição dos colonizados aos colonos europeus estabelece-se o que o autor chama de um duplo narcisismo. Neste, o “branco está preso em sua branquitude e o negro está preso em sua negritude”[7]. A representação de si dentro dessas categorias se constrói na relação de oposição ao outro. Ou seja, para Fanon, dentro desse sistema, resta apenas uma alternativa ao colonizado que deseja se valorizar: ocupar o lugar do outro, pois só o outro pode ser completo. O negro deve tentar sob todo custo tornar-se branco[8].

Essa negação de si coloca o colonizado numa posição neurótica, num confronto psíquico contra si próprio e como consequência nasce nele um “complexo de inferioridade”. É justamente deste complexo que o colonialismo europeu se apropria e deste se alimenta.

O “complexo de inferioridade” do colonizado começa, para Fanon, na infância, uma vez que há uma divergência profunda entre o universo infantil das referências familiares e o universo público, marcado pela dominação e tutela europeia.

Para uma criança européia, que sai do ambiente doméstico para o público, há uma coerência entre a as figuras do universo familiar (alicerces da psiquê) e os símbolos coletivos e nacionais. As referências coletivas, para o branco, falam sobre sua família, seus pais e sobre ele próprio. O mesmo não ocorre com o colonizado, como nos diz Fanon:”Uma criança negra, normal, tendo crescido no seio de uma família normal, ficará anormal ao menor contato com o mundo branco.” [9]

Há três elementos essenciais para o sistema de referências do inconsciente da coletividade[10] que criam essa cisão. O primeiro deles é a Nação, que se manifesta através de um conjunto de símbolos: heróis nacionais, a história nacional, o exército, o líder político, entre outras. Estes são, segundo Fanon, figuras associadas à paternidade. Para a criança negra martinicana, impõem-se referências européias, incoerentes com as de seu inconsciente. Além disso, os colonos são aqueles que têm prestígio social, poder e riqueza, reproduzindo cotidianamente a superioridade do branco.

Por último, Fanon aborda outro elemento decisivo no universo de referências infantis e juvenis, que em sua época eram as Revistas ilustradas. Este material ocupava o papel que hoje ocupam os programas de TV, animações e os videogames. Sobre as quais afirma:

“Em toda a sociedade, em toda coletividade, existe e deve existir um canal, uma porta de saída pela qual as energias acumuladas, sob forma de agressividade, possam ser liberadas. (…)É isso que tendem os jogos para crianças (…)e de modo mais geral as revistas ilustradas para os jovens ,-cada tipo de sociedade exigindo, naturalmente, uma forma de catarse determinada.

As histórias de Tarzan, dos exploradores de doze anos, de Mickey e todos os jornais ilustrados tendem a um verdadeiro desafogo da agressividade coletiva. São jornais escritos pelos brancos e destinados às crianças brancas. Ora, o drama está justamente aí. Nas Antilhas-e outras colônias- os mesmo periódicos ilustrados são consumidos pelos jovens nativos. E o Lobo, o Diabo, o Gênio do mal, o Mal, o Selvagem são sempre representados por um preto ou um índio. E como sempre há identificação com o vencedor, o menino negro torna-se (em suas fantasias) o explorador, aventureiro, missionário ´que corre o risco de ser comido pelos pretos malvados tanto como o menino branco.” [11]

Vemos, portanto, que o universo de referências de uma criança negra, num ambiente colonial não o enxerga. E, quando o faz, sua imagem é inferiorizada ou negativa. As consequências psíquicas dessa ruptura são significativas, como nos mostra Fanon: 

“Qual é nossa proposição? Simplesmente esta: quando os negros abordam o mundo branco, há uma certa ação sensibilizante. Se a estrutura psíquica se revela frágil, tem-se um desmoronamento do ego. O negro cessa de se comportar como indivíduo acional. O sentido de sua ação estará no Outro(sob forma do branco), pois só o Outro pode valorizá-lo”[12].

Voltemos à interlocução que Fanon estabelece com Sartre num aspecto importante da operação do sistema racista: a construção dos estereótipos. 

Sobre a inferiorização do judeu, Sartre afirmou:

“O judeu é um homem que os outros consideram judeu: eis a verdade simples de onde deve se partir: é o anti-semita que faz o judeu” [13].

Após expor a interessante construção sobre a questão judaica na mentalidade européia, feita através do trabalho de Sartre, Fanon busca compreender a construção dos estereótipos sobre o negro, afirmando:

“Tem-se medo do judeu por causa do seu potencial apropriador. ´Eles estão por toda a parte, infestam os bancos, bolsas, o governo. Reinam sobre tudo. Em pouco tempo o país lhes pertencerá. (…)’Quanto aos negros…… eles têm a potência sexual. Pensem bem, com a liberdade que tem em plena selva! Parece que se deitam em qualquer lugar e qualquer momento. Eles são genitais.” [14]

Nesta formulação apresentada de modo provocativo, por Fanon, ambos judeus e negros ameaçam a sociedade europeia branca; o judeu representa o perigo intelectual e o negro o perigo biológico. Basta observar-se os paralelos estabelecidos pela mentalidade racista europeia, associando Judeus e Negros a diferentes espécies animais: estratégia muito eficaz de rebaixamento de seu status de humanidade. O judeu foi chamado de Rato: animal sorrateiro, esperto, que se escondem nos porões para roubar; um mal quase invisível. O negro por sua vez foi associado ao macaco, animal fisicamente forte e ágil, podendo ser potente, violento e brutal, como suposto no caso dos gorilas.

A conceituação pela mentalidade européia da inferiorização do negro terá como critério fundante, como vimos, a vinculação direta entre o negro e a potência sexual, corpórea e biológica. Constrói-se desta forma uma categoria de ser humano menos “civilizados” na medida em que, ao contrário dos europeus, são reféns dos impulsos: impulsos de agressividade, impulsos musculares e sobretudo impulsos sexuais.

O autor observa mais profundamente as atitudes discriminatórias do europeu ao negro por essa perspectiva. Fanon chama esta discriminação de “negrofobia”. Devemos lembrar que o termo “racismo”, comumente é usado como sinônimo de discriminação, aqui é muito mais amplo, significando: sistema que opera em toda a sociedade.

Para Fanon, a atitude discriminatória da mulher branca em relação ao negro (sobretudo o homem negro) seria provocada por uma inquietação sexual, uma relação dupla de fobia e desejo. Por serem as negrófobas, em geral, mulheres sexualmente frustradas, atribuem ao homem negro poderes sexuais capazes de superar suas mazelas. A simples presença do negro, para estas mulheres, produz um sentimento fóbico, e a atitude violenta é uma resposta repressora ao seu desejo[15].

Para homens negrófobos, por sua vez, Fanon apresenta duas possibilidades interessantes. Na primeira, o negro representaria um terrível concorrente para o branco, por acreditarem ele ser dono de uma potência que nunca poderiam atingir. Daí causando um sentimento de inferioridade. O inseguro ou impotente sente-se ameaçado diante da potência e virilidade que atribui ao outro. Há uma segunda possibilidade, na qual o branco discrimina o negro, pois diante dele evidencia-se seu recalque sexual. Ou seja, age com violência contra um objeto de desejo como negação da própria homossexualidade não-aceita. Baseado nessas hipóteses, Fanon cunha o termo “vingança sexual” que, para ele, gera a perseguição aos negros:

“O linchamento do negro não seria uma vingança sexual? Sabemos tudo o que as sevícias, as torturas, os muros, comportam de sexual. Basta ler Marquês de Sade para nos convencermos. ..A superioridade do negro é real? Todo mundo sabe que não. Mas o importante não é isso. O pensamento pré-lógico do fóbico decidiu que é assim” [16]

A vinculação estereotípica do negro ao corpo deriva do “complexo de autoridade” europeu, pelo qual afirma a racionalidade como valor maior humano. O colonizador se auto-constrói como ser racionalmente superior aos outros. Desta forma depositam no Outros atributos corporais regidas pelo instinto: como a agilidade, a força, potência e sensualidade, numa dupla estratégia de desumanização do outro e super-humanização de si.

Em “Os condenados da terra” Fanon tratou de maneira mais concreta das relações de dominação no seio da colonização, apresentando a montagem das estruturas de dominação sociedade colonial para além da esfera psíquica. No ambiente colonial o nativo encontra-se confinado e restrito. O espaço físico a ser ocupado pelo colonizado é restrito e determinado, e deve se dar por moldes metropolitanos, regido pelas elites coloniais.

Na cidade colonial, o lugar do colonizado são os guetos e periferias, bairros sujos e mal estruturados. Enquanto isto, o colono tem acesso à cidade central e moderna, na qual circula sem restrição. A polícia e o exército metropolitano, detendo o monopólio da força, são essenciais para assegurar a demarcação desses espaços[17].

Fanon vê como consequência dessa restrição forçada uma repressão de energias musculares. O colonizado, constantemente vigiado, torna-se na relação com o colono muscularmente restrito, seus movimentos são atentamente observados. A energia muscular, porém, terá vazão por outras vias, como aponta Fanon:

“Esse é o mundo colonial. O indígena é um ser confinado(…)a primeira coisa que o indígena aprende é ficar no seu lugar ,a não passar dos limites. É por isso que os sonhos do indígena são sonhos musculares, sonhos de ação, sonhos agressivos. Durante a colonização, o colonizado não para de libertar-se entre as nove horas da noite e a seis da manhã. “[18]

Além dos sonhos, objeto essencial ao acesso do inconsciente pelos psicanalistas, Fanon aponta para explosões musculares desproporcionais como forma de vazão dessa energia reprimida. A dança, a sexualidade e a possessão, os esportes, entre outros, tornam-se veículos fundamentais de liberação energética. A violência, porém, torna-se para Fanon a via por excelência de descarga energética. Essas explosões de violência se darão sobre tudo longe da vigilância dos colonos, ou seja, entre os próprios colonizados. Esse fenômeno é chamado pelo autor de “autodestruição” do colonizado, que causará violência endêmica nos bairros periféricos.

Desta maneira, o colonizado acaba inevitavelmente reafirmando os estereótipos raciais cunhados pelos colonos. Ele se torna corporal, violento e explosivo, alimentando assim o sistema racista que o desumaniza.

Observamos na obra de Fanon, principalmente em “Pela Negra, Máscaras brancas” um tom muito direto e as vezes quase individual se dirigindo ao colonizado. Em diversas sentenças “o negro” aparece como o sujeito gramatical, agente em relação aos termos de sua exclusão. Fanon, como bom lacaniano, não utiliza a linguagem de maneira arbitraria. Esta atitude é coerente com a ideia do autor de que o negro deve ser responsabilizado pelas consequências mentais da exclusão colonial.

Não se trata, obviamente, de culpá-lo pelas consequências psicológicas de sua exclusão, mas trata-se de mostrar ao excluído que os “termos” produzidos por esse sistema lhe pertencem.

Não por acaso, para Lacan, os sujeitos psíquicos devem ser sempre responsáveis. Os fatores sócio-políticos e culturais que produzem consequências psíquicas podem ser externos aos sujeitos, mas nunca externos ao indivíduo. Em outras palavras, na medida em que um sistema de injustiças é internalizado por sua “vítima”, ele se torna parte dela e só pode ser terapeuticamente tratado se vinculado pela ação do sujeito[19].

O indivíduo, portanto, para a psicanálise, só pode superar uma questão (patológica, por exemplo) que está em si, na medida em que se responsabiliza por ela. Um paciente, ao ser tratado como “não sujeito” passa a ser tutelado e alienado, tornando-se sempre dependente, sem possibilidades de emancipação.

Em outras palavras, para a retórica fanoniana, o indivíduo negro não deve assumir a posição de vítima diante daquilo que o vitimiza, e sim de sujeito.

Vejamos mais claramente essa ideia nas palavras do autor:

“(…) fazendo apelo à humanidade, ao sentimento de dignidade, ao amor, à caridade, seria fácil provar ou forçar a admissão de que o negro é igual ao branco. Mas nosso objetivo é outro. O que nós queremos é ajudar o negro a se libertar do arsenal de complexos germinados no seio da situação colonial.”[20]

As obras de Fanon não têm, evidentemente, apenas pretensões terapêuticas. Seus livros não são direcionados somente a psicanalistas que trabalharam com a saúde mental do negro; tampouco são obras de auto-ajuda. Fanon pretende, ao contrário, que através da tomada de consciência do complexo de inferioridade, nasça um potencial pela reivindicação e pela superação do sistema colonial e racista.

O método psicanalítico, em Fanon, é ferramenta para a libertação. Através dele se recusa uma descolonização pela tutela européia ou pela burguesia nacional europeizada. Aqui, a “responsabilização” e lutados próprios colonizados são a única via para uma verdadeira emancipação.

Como vimos, Frantz Fanon , através de sua obra seminal, apresenta o racismo como sistema complexo que cumpriu duplamente os papeis de motor e combustível da expansão europeia e do colonialismo. Sua obra escancara a profundidade das raízes racistas na construção da sociedade ocidental e nos mostra que não há alternativas efetivas para solução dessa questão que não sejam em si também profundas e radicais. 

[1]Mestrando em História Social pela FFLCH-USP e Membro do Núcleo de Estudos de África, Colonialidade e Cultura Política (NEACP-DH-USP).

[2]Fanon, Frantz. Pele Negra, Mascaras Brancas. Salvador, Edufba, 2008. E Fanon, Frantz. Os condenados da Terra. Juíz de Fora. Editora Ufjf. 2010.

[3]Fanon, Frantz. Op. Cit, 2008, p 85.

[4] Fanon, Frantz. Op. Cit, 2008, p 89.

[5] Fanon, Frantz. Op. Cit, 2008, p 90.

[6] Fanon, Frantz. Op. Cit, 2008, p 90.

[7] Fanon, Frantz. Op. Cit, 2008, p 27-30.

[8] Fanon. Op. Cit, 2008, p 94.

[9] Fanon. Op. Cit, 2008, p 94.

[10] Fanon parece utilizar o termo “inconsciente da coletividade” como alternativa à “inconsciente coletivo” conceituado por Jung. Pois há divergências entre a abordagem lacaniana de inconsciente individual utilizada por ele e a jungiana de “inconsciente coletivo” inexplorada pelo autor. Compreendermos que Fanon privilegia os aspectos culturais “mentais” da coletividade, em detrimento dos arquétipos que ocupam centralidade na teoria de Jung.

[11] Fanon. Op. Cit, 2008, p 130-131.

[12] Fanon. Op. Cit, 2008, p 136.

[13] Fanon. Op. Cit, 2008, p 130-131.

[14] Fanon. Op. Cit, 2008, p 130-131.

[15]Fanon. Op. Cit., 2008, p 132-140.

[16] Fanon. Op. Cit., 2008, p 139.

[17] Idem, Os condenados da Terra. Juíz de Fora: Editora Ufjf. 2010, p. 50-65.

[18] Idem, Op. Cit. 2010, p. 69.

[19] Lacan, J. – La Science et la vérité, in Écrits, Paris, Edition du Seuil, 1966, p. 858.

[20] Fanon, Op. Cit., 2008.  

Fonte:  https://www.geledes.org.br/racismo-e-dominacao-psiquica-em-frantz-fanon-2/

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