Mukbang: Entretenimento, Cultura e Crítica na Era Digital

 

 

O mukbang, termo derivado da expressão coreana "muk-ja bang" (transmissão de comer), surgiu na Coreia do Sul no final dos anos 2000 como um fenômeno cultural ligado à solidão urbana e ao consumo de mídia. Inicialmente transmitido em plataformas como AfreecaTV, o formato consiste em criadores comendo grandes quantidades de comida enquanto interagem com espectadores ao vivo. A prática ganhou popularidade como uma forma de combater a isolamento social, oferecendo companhia virtual durante refeições, especialmente em um contexto onde muitos jovens sul-coreanos viviam sozinhos (The Korea Herald, 2016). Sua ascensão está ligada à combinação de entretenimento, ASMR (sons relaxantes de mastigação) e voyeurismo gastronômico. 

Culturalmente, o mukbang reflete contradições da sociedade moderna. Por um lado, celebra a conexão humana através da comida, resgatando o aspecto comunitário das refeições. Por outro, expõe hábitos de consumo excessivo, muitas vezes associados a desafios de saúde pública, como a obesidade. Estudos apontam que o gênero ativa respostas sensoriais e emocionais nos espectadores, simulando a experiência de comer em grupo (Jeong & Lee, 2017, Sage Journals). Além disso, a estética hiperbólica — pratos gigantes ou comidas exóticas — tornou-se uma estratégia para capturar audiências globais, especialmente em plataformas como YouTube e TikTok. 

A globalização do mukbang adaptou-se a contextos locais. No Brasil, por exemplo, criadores incorporaram pratos típicos como feijoada e churrasco, mesclando tradição culinária com o apelo visual do formato (Folha de S.Paulo, 2021). Nos EUA, influenciadores como Zach Choi transformaram a prática em um negócio lucrativo, com vídeos que ultrapassam milhões de visualizações. Essa adaptação revela como o mukbang transcende fronteiras, tornando-se um fenômeno híbrido entre entretenimento, marketing e expressão cultural (Vox, 2019). 

Apesar do sucesso, o gênero enfrenta críticas. Especialistas em saúde alertam para a normalização de hábitos alimentares desregrados, enquanto ambientalistas questionam o desperdício de comida em transmissões que priorizam o espetáculo (The Guardian, 2020). Psicólogos também destacam riscos de distúrbios alimentares entre criadores e espectadores, já que a glorificação de porções exageradas pode distorcer a relação com a comida (NCBI, 2018). Tais debates evidenciam a complexidade do mukbang, que oscila entre arte, vício e crítica social. 

Em síntese, o mukbang é um espelho da cultura digital: conecta pessoas, mas também amplifica contradições do consumo contemporâneo. Sua evolução ilustra como a internet transforma práticas cotidianas em espetáculo, desafiando noções tradicionais de comunidade e saúde. Como observa a pesquisadora Michelle Lim (2018), "o mukbang não é só sobre comer; é sobre preencher vazios em uma sociedade cada vez mais fragmentada”

PARA SABER MAIS:

Mukbang, o fenômeno que faz milhões assistirem a youtubers comendo sem parar

Referências:

  • Jeong, H., & Lee, J. (2017). The Socio-Cultural Dynamics of Mukbang. Sage Journals.
  • The Korea Herald. (2016). Mukbang: A Cultural Phenomenon Born from Loneliness.
  • Vox. (2019). How Mukbang Became a Global Obsession.
  • Folha de S.Paulo. (2021). Mukbang à brasileira: Adaptações locais de fenômeno coreano.
  • The Guardian. (2020). The Dark Side of Mukbang Culture.
  • NCBI. (2018). Eating Disorders in the Digital Age.
  • Lim, M. (2018). Digital Intimacy and Food Media. Cambridge University Press.
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