Treinamento em habilidades sociais

Optar por ser ou não assertivo é saber se adaptar às circunstâncias:uma competência necessária para se manter uma relação interpessoal bem-sucedida, que leva em conta o contexto de cada situação.

Por Mônica Portella e Veruska Santos

Nas últimas décadas, um corpo consistente de teóricos vem produzindo conhecimento e pesquisa sobre as habilidades sociais. Habilidade Social (HS) é a denominação dada às diferentes classes de comportamentos sociais disponíveis no repertório de uma pessoa, que contribuem para a qualidade e a efetividade das interações que ela estabelece com as outras pessoas. Tais habilidades dizem respeito a comportamentos necessários a uma relação interpessoal bem-sucedida, conforme parâmetros típicos de um determinado contexto e cultura.

Segundo Del Prette e Del Prette (2001), as habilidades sociais envolvem desempenho social competente, sendo que este pode ser prejudicado por ansiedade, crenças errôneas e uma avaliação equivocada do ambiente.

As pessoas socialmente hábeis (ou com competência social) tendem a apresentar relações pessoais e profissionais mais produtivas, satisfatórias e duradouras, além de bem-estar físico e mental e bom funcionamento psicológico (Del Prette e Del Prette, 2004). De acordo com Goleman (2001), pessoas que se destacam no ambiente corporativo possuem competência social acima da média. Para alguns pesquisadores, terapeutas socialmente aptos produzem melhores resultados terapêuticos, independentemente de sua abordagem.

Por outro lado, déficits em habilidades sociais geram dificuldades e conflitos interpessoais, pior qualidade de vida e diversos problemas psicológicos. Déficits em habilidades sociais estão presentes em patologias como fobia social, síndrome de Asperger, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno invasivo, transtorno do humor (como depressão e transtorno bipolar), etc. Logo, o treinamento em habilidades sociais pode ser empregado com pacientes portadores dos problemas supracitados.

Cabe ressaltar que o treinamento em habilidades sociais não é importante apenas para pessoas portadoras de grandes déficits. Este também pode ser útil para pessoas que desejam melhorar as suas habilidades sociais em função de demandas pessoais ou profissionais. Quanto maior o desenvolvimento profissional e pessoal de uma pessoa, mais ela precisará interagir com os outros, necessitando assim de um repertório social bem-desenvolvido e de habilidades sociais, como a assertividade, empatia, comunicação verbal e não verbal, etc.

As habilidades sociais envolvem desempenho social competente, sendo que este pode ser prejudicado pela ansiedade

Há uma série de classificações para as habilidades sociais, como as de Galassi e Galassi, 1977; Furnham e Henderson, 1984; Gay e cols, 1975; Liberman e cols, 1977; Rinn e Markle, 1979; Michelson e cols, 1986, Del Prette e Del Prette, 2001, 2004, Caballo (2003), entre outros. As dimensões mais comumente aceitas incluem comportamentos como iniciar, manter e encerrar conversações; fazer e responder perguntas; falar em público; expressar amor, agrado e afeto; expressar sentimento positivo; ser empático; defender próprios direitos; pedir favores; recusar pedidos; aceitar elogios; expressar opiniões pessoais, até mesmo discordantes; expressar incômodo, desagrado ou enfado; desculpar-se ou admitir ignorância; pedir mudança de comportamento do outro e enfrentar críticas; ser empático com os outros; refletir sentimentos e expressar apoio; solicitar e fornecer feedback positivo e negativo, etc.

A assertividade se refere a um continuum que vai do comportamento passivo, passando pelo comportamento assertivo até chegar ao comportamento agressivo.

A pessoa agressiva geralmente consegue aquilo que quer. Ela é direta, incisiva, usa um tom de voz alto, utiliza o dedo em riste. Muitas vezes faz ameaças, possui um volume alto e a velocidade da fala é rápida. O fato é que, na maioria das vezes, o agressivo consegue sua meta, no entanto, em longo prazo, a agressividade tem um custo alto. Para Caballo (2008), Smith (1997), Alberti e Emmons (2008), a raiva tem um efeito muito negativo na clareza e eficácia da comunicação com as outras pessoas. Elas prestam mais atenção à raiva e menos ao que está se tentando comunicar. O agressivo desrespeita os direitos individuais dos demais e faz que o outro se sinta magoado, indefeso e humilhado. Sua atitude gera ressentimento e frustração, sentimentos que mais tarde poderão retornar como vingança.

Passividade prejudicial

No comportamento passivo, a pessoa vai sempre ceder e fazer tudo o que os outros querem, porque o que o passivo menos se importa é com ele, então é fácil lidar com pessoas passivas. O tom de voz é baixo, às vezes inaudível, e o passivo não encara o interlocutor, olha para baixo, com expressão de medo, de tristeza, quase não gesticula, esfrega as mãos demonstrando ansiedade. Estudos mostram que sintomas físicos como dor de cabeça, cansaço geral, problemas estomacais, alergias e asma estão associados ao comportamento não assertivo.

No comportamento passivo agressivo, a pessoa utiliza elementos de agressividade e de passividade. Faz o mínimo de contato visual possível, geralmente olha para frente, apresenta uma postura fechada, usa de indiretas em seu discurso, sendo muitas vezes irônico, sarcástico e possui senso de humor duvidoso e irritante. É manipulador e superficial em suas relações e dificilmente se coloca para não se envolver nem com as pessoas, nem com as situações e quando o faz distorce as palavras dos outros. Fala por indiretas e faz com que os outros se sintam culpados, desempenhando o papel de coitadinho, injustiçado.

No comportamento assertivo, nem sempre a pessoa consegue aquilo que quer. Às vezes, é mais fácil conseguir o que se quer pela intimidação por comportamento agressivo do que pelo assertivo. No entanto, o assertivo defende as suas posições sem ansiedade, expressa seus sentimentos de maneira honesta e tranquila. O assertivo exerce seus direitos sem negar os dos outros, vai direto ao ponto, usa um tom de voz equilibrado, olha diretamente nos olhos, a velocidade da fala é tranquila, a expressão da face é relaxada, porém séria.

Com moderação

Ninguém é 100% assertivo com todas as pessoas e em todas as situações. O certo não é ser assertivo sempre, e uma pessoa competente socialmente é capaz de transitar por todo o continuum. Dependendo do objetivo da pessoa, de com quem ela está lidando, vai adotar um comportamento ou outro. O comportamento assertivo é específico da pessoa e da situação, não é universal.

Numa situação em que a pessoa está sendo assaltada, por exemplo, se ela agir assertivamente provavelmente irá argumentar com o ladrão, porque ele não deve levar a sua carteira. Nessa situação, ser assertivo não é sinônimo de competência social, muito pelo contrário. Ser assertivo nesse momento é burrice. O comportamento adaptativo socialmente falando, nesse caso, é ser passivo e entregar a carteira sem argumentações.

Como vimos nos exemplos anteriores, existem situações em que o adaptativo é ser passivo e outras em que o adaptativo é ser agressivo, e isso dependerá da situação, do contexto e do seu objetivo numa determinada situação. E qual o comportamento mais adequado em cada situação? Isso vai depender primeiro da relação interpessoal que estamos vivendo e, segundo, das nossas crenças e objetivos no que se refere à situação. Ser assertivo ou não é um sinal de inteligência e de competência social, mas, às vezes, ser assertivo não é a coisa mais correta a se fazer.

Comportar-se assertivamente nem sempre é fácil e muitas vezes precisa de treinamento, principalmente se estivermos envolvidos emocionalmente. É relativamente fácil agir assertivamente com pessoas que não conhecemos e que provavelmente não iremos mais travar relações, como são as relações de consumo. Mas se a pessoa em questão é do nosso círculo de relação, e mais ainda quando é íntima, fica mais difícil se comportar assertivamente. Os grandes vilões da assertividade são o medo e a culpa. Quando lidamos com esses estados emocionais dificilmente conseguimos desempenhar comportamentos assertivos. Geralmente, temos dificuldade em dizer não, recusar pedidos nas relações íntimas porque, na maioria das vezes, estados emocionais como o medo ou a culpa estão envolvidos (veja box Categorias do Comportamento Assertivo).

O THS pode ser empregado tanto com pessoas portadoras de grandes déficits quanto com pessoas que não possuem déficits, mas que em função de necessidades pessoais ou profissionais precisam aperfeiçoar suas HS.

A assertividade é uma habilidade social, e como toda habilidade social precisa ser praticada. Sem prática e exercícios não há aquisição de assertividade. Exatamente por isso, os trabalhos para desenvolver assertividade priorizam o aspecto comportamental, destacado neste artigo. No entanto, vale lembrar que os aspectos cognitivo (reestruturação cognitiva e treinamento em solução de problemas) e emocional (respiração diafragmática e relaxamento) precisam ser trabalhados para que a aquisição seja plena. É, ainda, uma habilidade fundamental para o crescimento e desenvolvimento pessoal, porque quando somos assertivos dizendo e fazendo o que queremos, além de dirigirmos nossas vidas, ganhamos tempo e energia para nos dedicarmos às coisas que realmente importam para nós. Um desempenho social assertivo gera autoconfiança e motivação para potencializar forças pessoais que promoverão bem-estar e maior qualidade de vida.

Para Saber Mais:

CABALLO, V. Manual de Avaliação e Treinamento das Habilidades Sociais. São Paulo: Ed. Santos, 2008. CABALLO, V. Manual de Técnicas de Terapia e Modificação do Comportamento. São Paulo: Ed. Santos, 2002.
DEL PRETTE, Z. A. P. & DEL PRETTE, A. Psicologia das Habilidades Sociais: Terapia, Educação e Trabalho. Rio de Janeiro: Vozes, 2008.
PORTELLA, M. Como identificar a mentira: sinais não verbais da dissimulação. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2006

Fonte: http://psiquecienciaevida.uol.com.br/ESPS/Edicoes/63/artigo212045-1.asp 

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