O dinheiro e seu valor

Qual a importância do dinheiro?

Pesquisa mostra que 70% dos brasileiros acreditam que o dinheiro é mais importante hoje do que foi no passado

Por Cinthia Scheffer - Colaborou Fernanda Maranhão 

Sinais de mudança começam a aparecer

Para o professor da UFSC Jurandir Sell de Macedo, doutor em finanças comportamentais, o que faz crescer a importância do dinheiro para as pessoas é a busca pelo status que ele traz. “As pessoas querem ser respeitadas, reconhecidas em seus grupos. E, principalmente, é preciso comunicar rapidamente este status, com o que o dinheiro pode comprar”, diz. “Meu avô foi um homem de sucesso, respeitado na cidade em que vivia e deu nome a uma praça. Mas nunca foi um homem rico. Hoje, se mede o sucesso pela riqueza, mesmo que ele não seja real.”

Macedo vê, no entanto, sinais de uma mudança de comportamento. “Muita gente chegou lá e está se questionando: ganhei tudo o que queria e não estou feliz”, diz. “Nossa sociedade glorifica a falta de tempo. Quando no fundo, ter sucesso é ter tempo.” É o que o economista Fabiano Calil chama de “novo conceito de luxo”. “O luxo não é mais sinônimo de ter um jatinho. É poder ir ao cinema às duas da tarde, em um dia de semana, com o filho. Eu preciso de dinheiro para fazer de fato o que desejo? O importante não é se gasto R$ 100 mil, mas como? Com o que?”

Simples

Para o professor da UFSC, a sociedade começa lentamente uma mudança de rumo, quebrando um preceito do capitalismo de que dinheiro é sinônimo de felicidade. “Caminhamos para uma vida mais simples, na qual não se glorifica o dinheiro, mas também não se repudia.”

Por outro lado, a psicanalista Márcia Tolotti diz não ter tanta certeza de que a sociedade caminha para um mudança desses valores. “Uma mudança nesse sentido é uma escolha da humanidade, mas composta por cada um de nós”, diz. “Mas estamos criando filhos que só conseguem se sentir seguros à medida em que compram coisas. Nós não sabemos mais para onde vamos em função de dinheiro, de aparência. É um momento de, no mínimo, repensar o que ele está trazendo para nós e o que tem por trás daquela moeda.”

Há pouco mais de um ano, o economista inglês Mark Boley, de 30 anos, vive sem dinheiro. Cansado do “destrutivo sistema capitalista”, se desfez de todos os seus bens e passou a viver em um trailer, se alimentar do que encontra na mata e tomar banho com sabonete feito por ele com cartilagem de peixe e sementes de erva doce. Boley é uma curiosa exceção em uma sociedade que acredita que o dinheiro é mais importante hoje do que foi no passado. Segundo um levantamento mundial feito pela Ipsos, multinacional francesa de pesquisa, 65% das pessoas ao re­­dor do mundo têm essa visão.

Entre os brasileiros, o índice sobe para 70%, e entre os coreano, chineses e japoneses, a 85%. A pesquisa revela ainda uma minoria nada desprezível de 48% dos brasileiros que acreditam que o dinheiro é o maior sinal de sucesso.

Para o consultor de investimentos Raphael Cordeiro, esse aumento da importância do dinheiro para as pessoas é natural – fruto de uma sociedade que se desenvolveu e se especializou. “As trocas são cada vez mais intensas e, por isso, o dinheiro ganha relevância. Minha avó fazia pão, goiabada e refrigerante, tinha uma horta e criava galinhas em casa. Diferente de mim, que se quero a bebida, preciso ir comprar”, compara.

O grande problema, diz Cordeiro, não está no aumento da importância, mas no fato de que talvez os brasileiros, em especial, não estejam tão preparados para lidar com o dinheiro nessa intensidade, com serviços financeiros tão evoluídos. “Os mais preparados tiram vantagem disso.”

É essa justamente a preocupação da médica Cristina Horiuchi, para quem mais importante do que ter dinheiro é saber administrá-lo. “O dinheiro pode proporcionar o conforto da família, uma boa educação para meu filho, viagens. Mas não é o dinheiro que me traz a felicidade”, diz. “Já fui muito gananciosa, o que me atrapalhou muito. Hoje, entrei em um equilíbrio.”

Consumo

Para alguns especialistas em economia comportamental, no entanto, os dados da pesquisa são sintomas de uma sociedade que valoriza em demasia o consumo e que, possivelmente, esteja dando um valor equivocado ao dinheiro. “Talvez a gente o esteja colocando no lugar errado, como o dinheiro por dinheiro. Não faz sentido ele ter mais valor que no passado porque ele continua sendo o mesmo meio de troca”, diz o economista Fabiano Calil, especialista em finanças pessoais.

Para Calil, no passado havia mais clareza do papel do dinheiro como meio, e não como fim. “Hoje, as pessoas têm a meta de ter ‘um milhão de dinheiros’. Mas há um grande vazio nisso. Um milhão para quê?”. Muitos dos seus clientes não têm essa resposta.

O equívoco, acredita a psicanalista Márcia Tolotti, autora do livro Armadilhas do Consumo, é natural em uma sociedade do hiperconsumo, na qual as pessoas são convocadas a comprar muito. Assim, diz Márcia, é inevitável que elas associem o meio que gera isso, que é o dinheiro, à felicidade. “Se o meu princípio está na aquisição e no dinheiro, ele tem que ser, de fato, a coisa mais importante da minha vida”, diz. “Mas é a ideia de felicidade como possibilidade de adquirir coisas que está um pouco equivocada.” 

Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/economia/qual-a-importancia-do-dinheiro-0au6nj30727ud8mogblv9ll5a

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