Soteria: uma experiência alternativa ao tratamento das psicoses
Experiências Alternativas ao Modelo Biomédico da Medicina Mental - O paradigma de Soteria
Por Fernando Freitas
A EXPERIÊNCIA DE SOTERIA
No final da década de 60 e começo da de 70, muitas experiências foram criadas para oferecer alternativas de comunidades terapêuticas à hospitalização das pessoas diagnosticadas com esquizofrenia. Eram experiências que tentavam entender a esquizofrenia com quadros de referência distintos do modelo médico intervencionista, entendendo-a como um importante aspecto da história de vida individual [i].
Recusando o uso da medicação antipsicótica como primeira opção de tratamento, tais iniciativas tomavam como foco a necessidade de permitir os indivíduos atravessarem a sua experiência de psicose com um mínimo possível de interferência e o máximo possível de suporte psicossocial.
A lembrar: nos Estados Unidos e em vários países da Europa, nos anos 60 e 70, o ‘hospitalocentrismo’ estava deixando de ser a referência principal para a organização da assistência psiquiátrica. O ‘hospitalocentrismo’ demonstrava ser irracional, seja sob o ponto de vista econômico e político, mas também sob a perspectiva científica e ética propriamente dita.
E muito particularmente haviam os interesses da aliança entre a psiquiatria e a indústria farmacêutica. Fora do hospital psiquiátrico, na ‘comunidade’/ou ‘território’, uma nova racionalidade de mercado se abria, com a conquista e a incorporação de novos ‘atores’ sociais. Novas categorias de pacientes, obviamente; mas, sobretudo, um novo mercado de ‘saúde mental’. Para que tais objetivos pudessem ser alcançados, centralizar no hospital os cuidados psiquiátricos se constituía em um incômodo obstáculo institucional. Já que ‘de perto ninguém é normal’, seria impossível incluir a todos no hospital psiquiátrico. O que somente seria possível na ‘comunidade’, no ‘território’.
É nesse contexto que a experiência de Soteria ganha relevância internacional. Ainda que entre nós brasileiros tenha sido uma experiência praticamente desconhecida.
Como foi iniciada?
Soteria correu originalmente na baía de San Francisco, Califórnia, Estados Unidos, durante os anos 1970 e o começo dos anos 1980. E desde então vem sendo implantada em diversos outros locais dos Estados Unidos, como em Vermon, e em países europeus, como Inglaterra, Suíça, Suécia, Finlândia, Alemanha, Hungria, entre outros .
Em abril de 1971, o psiquiatra Loren R. Mosher, Voyce Hendrix e um grupo de colegas se juntaram e fundaram a Casa Soteria.
É para chamar a nossa atenção a escolha do nome ‘Soteria’. A palavra é de origem grega, que significa ‘libertação’, ‘salvação’. Soteria foi o nome dado a uma proposta de tratamento na comunidade, que não apenas era uma alternativa aos modelos dominantes, mas uma abordagem radical. Quer dizer, um tratamento fora do hospital, em uma residência, onde era oferecido refúgio às pessoas, a maioria jovens, a maioria diagnosticada como “esquizofrênicos”, e todos sofrendo de severo sofrimento psíquico. E tratados radicalmente fora dos parâmetros da ‘medicina mental’ vigentes na época e hoje em dia.
Seus princípios básicos incluíam:
- a provisão de um meio terapêutico pequeno, acolhedor, terapêutico, na comunidade;
- com uma equipe formada por pessoas leigas;
- preservando o poder pessoal, as redes sociais e as responsabilidades compartilhadas;
- um estilo relacional ‘fenomenológico’, com o objetivo de dar sentido à experiência subjetiva da psicose da pessoa;
- desenvolvendo um entendimento da experiência psicótica ‘estando com’ e ‘fazendo com’ os clientes;
- e nenhuma, senão doses baixíssimas de medicação antipsicótica – com todas as drogas psiquiátricas sendo tomadas à partir de uma posição de escolha e sem coerção).
Nesse ambiente humanitário e igualitário, em Soteria as taxas de recuperação mostram ser muito mais elevadas do que em qualquer outro local de assistência psiquiátrica. Isso é o que foi alcançado na experiência original, na Califórnia; mas é o que ocorre em todos os locais onde a experiência Soteria é replicada.
O interesse no paradigma Soteria tem crescido tanto que recentemente foi criado no Reino Unido uma rede nacional Soteria, tendo havido uma conferência inaugural com vistas a implantar Soteria no país.
Soteria e o background
- Soteria juntou uma diversidade de distintas noções clínicas:
- Práticas da era do ‘tratamento moral’ em saúde mental surgidas no século XVIII nos Estados Unidos.
- Pioneiros da psicanálise nos Estados Unidos (Henry Stack Sullivan e Frieda Fromm-Reichmann, explorando a importância do potencial de cura das relações humanas).
- Terapeutas que descreveram o crescimento a partir da psicose (Karl A. Menninger).
- Um grupo de psiquiatras considerados hereges (Ronald D. Laing; Thomas Szasz).
- Cronistas do desenvolvimento do transtorno psiquiátrico como resposta à crise de vida.
- Alternativas ao modelo de assistência asilar (“Manicômios, Prisões e Conventos” de Erving Goffman).
- Um espaço para testar a validade das críticas dos ‘antipsiquiatras’, como na época eram vistos os que contestavam a psiquiatria vigente, tais como Laing, Cooper e Basagalia.
Características Gerais
A Casa Soteria original não era um hospital. Nem tampouco era um Centro de Saúde Mental (CSM). Seu programa não era dirigido por médicos (ou enfermeiros). Não obstante, Soteria admitia apenas clientes que seriam hospitalizados.
As drogas neurolépticas (antipsicóticos), o tratamento padrão para a “esquizofrenia”, eram usadas o menos frequentemente quanto era o possível, de preferência nunca.
A equipe era formada por não-professionais de saúde, com a responsabilidade, o poder e a autoridade para o tratamento primário e cotidiano.
E o mais importante, diferente das centenas de casas terapêuticas criadas em todo o território dos EUA durante os meados dos anos 1970 – os CSM -para servir de etapa intermediária entre a hospitalização e os lares, Soteria oferecia uma alternativa à hospitalização ao invés de acompanhá-la.
Soteria e as experiências alternativas da época
O que diferenciará radicalmente Soteria de outras experiências na época é que o paradigma Soteria tem o compromisso de ser uma alternativa de fato ao modelo biomédico da medicina mental. Assim sendo, o paradigma Soteria não propõe uma reforma psiquiátrica, mas um tratamento alternativo à psiquiatria propriamente dita, ao criar condições para se abordar os problemas tradicionalmente remetidos à psiquiatria – sem haver a necessidade do uso do diagnóstico psiquiátrico e do tratamento psicofarmacológico.
Daí que a principal fonte de inspiração de Soteria ter sido o projeto de Ronald Laing com a experiência de Kingsley Hall.
Soteria: seu compromisso com as evidências científicas
O compromisso de Soteria com as evidências científicas para julgar a validade da experiência merece uma atenção bastante especial nossa. Seu idealizador e principal referência foi o psiquiatra e cientista Lauren Mosher. Mosher foi o chefe do Centro de Estudos de Esquizofrenia do poderoso NIMH, de 1968-1980. Mosher deixará o cargo de direção no NIMH em 1980, justamente quando o DSM-III surgiu.
Durante 10 anos, Soteria teve financiamento para desenvolver uma pesquisa, coordenada justamente por Mosher. Uma pesquisa quantitativa, empírica, randomizada. [2] O suporte financeiro do NIMH foi para que Soteria respondesse a duas simples questões:
- “Podem as pessoas recentemente nomeadas ‘esquizofrênicas’, e em situação tão disfuncional a requerer hospitalização, serem tratadas com sucesso em um ambiente pequeno, como um lar, em um espaço não hospitalar e sem drogas antipsicóticas? ”
- “Como são os seus resultados clínicos comparados – em seis semanas, seis meses, e um ano e dois anos – com aqueles pacientes de um grupo de pessoas semelhantemente selecionadas e estudadas, que receberam a assistência habitual como paciente internado em um hospital e depois acompanhados fora do hospital? “
Resultados investigados: saber se fatores tais como ‘hospitalização’, ‘medicamentos’ e ‘sintomas psicóticos’ continuariam presentes, e se os níveis de funcionamento psicossocial melhorariam ou deteriorariam.
Hipótese: Se o progresso dos grupos tratados experimentalmente (Soteria) e tradicionalmente (Hospitais Psiquiátricos e Centros de Saúde Mental) fossem comparáveis, então esse novo tratamento seria tão ou melhor do que a prática corrente, e um fenômeno poderia sido definido. Suas partes constitutivas poderiam então ser estudadas para tentar desenredar as razões para a sua eficácia. Se o grupo experimental fosse pior, a pesquisa terminaria e o status quo estaria preservado.
Nos anos 1970, o senso-comum era que o tratamento psiquiátrico eficaz dependia do tratamento psicofarmacológico. A necessidade de diagnóstico psiquiátrico mais preciso estava em pauta, o que levará ao abandono dos critérios vigentes no DSM-I e DSM-II e à criação do DSM-III. Além disso, desde o começo dos anos 60, o tratamento psicofarmacológico era visto como essencial. Os hospitais psiquiátricos estavam sendo esvaziados, o tratamento sendo transferido para a ‘comunidade’. E os Centros de Saúde Mental (CSM) eram na época, nos Estados Unidos, os espaços alternativos à assistência hospitalar.
As questões do projeto parecem simples, mas não eram. Há muitos interesses dominantes em jogo. Portanto, as respostas ao Projeto Soteria seriam difíceis de aceitação.
Se poderia esperar que, após mais que 10 anos de pesquisa (e mais a criação de um segundo serviço experimental que durou 6 anos), uma resposta clara teria aparecido. De fato, Mosher acreditava que sim, com a publicação do seu estudo sobre os resultados de dois anos [3].
Mas o establishment científico vigente não concorda com os resultados. A aliança entre os interesses corporativos da psiquiatria e da indústria farmacêutica não aceita os resultados que poderiam destruir a própria aliança. Uma falha científica é considerada: a ausência de uma estrita atribuição aleatória (‘amostra randomizada’). Apesar da comparabilidade dos dois grupos em uma miríade de variáveis acessadas na admissão, o establishment científico finalmente negou fundos de pesquisa para estudar quais elementos no ambiente (“setting”) foram essenciais para o seu sucesso. O financiamento é suspenso, acabando a experiência original de Soteria. Apesar disso, a análise dos dados foi completada em março de 1992.
O cotidiano de Soteria
A casa Soteria. 12 quartos, hospedando seis residentes (jovens, solteiros, recentemente diagnosticados e rotulados como “esquizofrênicos”), dois membros da equipe em trabalho integral, geralmente um homem e uma mulher, e vários voluntários e ajudantes em tempo parcial. Além disso, cada casa Soteria tinha um diretor da casa e acesso a psiquiatras disponíveis por um par de horas por dia. O fato da casa poder hospedar apenas 6 pessoas se devia às leis para licenciamento residencial. Um ou dois novos residentes eram admitidos a cada mês, geralmente permanecendo por um período de três a seis meses.
O núcleo da equipe de Soteria, geralmente cerca de sete funcionários remunerados em tempo integral e mais os voluntários, quando nos estabelecimentos convencionais eram entre 7 a nove funcionários. Na verdade, em momentos de alta atividade – geralmente entre as 16:00 até à meia-noite – Soteria tentou ter um equilíbrio entre 50-50% de pessoas em plena crise com aquelas funcionando mais ou menos normalmente, incluindo residentes que haviam se recuperado o suficiente para serem auxiliares.
Essa equipe não profissional visava fornecer um ambiente social simples, semelhante a um lar, seguro, acolhedor, de suporte, calmo, tolerante e não-intrusivo.
Embora estivessem imbuídos pelos valores da contracultura dos anos 1960, os membros da equipe tinham um pacto de não serem militantes. A equipe de Soteria acreditava que o sincero envolvimento humano e o entendimento eram vitais para as interações de cura.
Os psiquiatras supervisionavam a equipe, serviam para dar segurança, e cumpriam com as suas responsabilidades formais médicas e legais.
A equipe e os residentes compartilhavam responsabilidade pela manutenção das tarefas da manutenção da casa, preparação da alimentação e limpeza.
O nome era ‘residentes’ (algumas vezes ‘clientes’), jamais ‘pacientes’, ‘consumidores’ ou ‘usuários’.
Não haviam cadeados nas portas; não haviam seringas e apenas haviam poucos medicamentos; nenhuma sala para contenção ou algo semelhante.
Seguindo a tradição que teve como pioneiro Sullivan, a equipe de Soteria, em tempo integral ou tempo parcial, não era de profissionais de saúde mental. Os administradores e os pesquisadores, esses sim tinham formação em vários campos da saúde mental – Alma, assistente social; Stan Redd, Ken Woodrow e Richard Poe, psiquiatras que sempre eram chamados e visitavam frequentemente, assim como Loren, o nome com maior projeção nacional e internacional, que havia estudado com psicanalistas sullivanianos em Harvard e com Laing em Londres, nos anos 1960. E Voyce Hendrix que não tinha formação formal alguma.
A Filosofia de Soteria
Loren estabeleceu a filosofia fundamental de Soteria. Ele planejou que a equipe de Soteria aprenderia a ver a reação ‘esquizofrênica’ como estado alterado de consciência de alguém em resposta à crise. Se uma ‘psicose’ se desenvolveu, ela cresceu em e afetou a matriz psicossocial da inteira família ou outro grupo íntimo, formando a ecologia perturbada da pessoa. Por conseguinte, com frequência, o inteiro meio ambiente perturbado e perturbador da pessoa – que não pode facilmente tolerar ou coexistir com os estranhos comportamentos que vem de um estado alterado de consciência – também experimenta a crise, portanto não apenas o indivíduo etiquetado de ‘louco’ é que está em crise.
Tal visão da ‘esquizofrenia’ implica em um conjunto de atitudes terapêuticas.
- A experiência psicótica perturbadora nem era abortada e nem forçada a assumir algo, mas vista como tendo potencial para reintegração e reconstituição.
- A equipe era incentivada a ver os muito aspectos da experiência da ‘esquizofrenia’ quanto o mais possível real ao invés de um processo de fragmentação, para tratar os seus sentimentos como potencial crescimento psicológico, reconstituição e reintegração em um todo de desenvolvimento psicossocial em um nível mais amplo.
Soteria colocava limites, quando os indivíduos estavam em perigo para consigo próprios ou para com os outros, mas não por causa de uma inabilidade para tolerar a loucura.
A equipe também aprendia a ver as qualidades místicas como metaforicamente válidas e compreensíveis, também em relação ao background cultural como em relação à dinâmica da família.
As linhas de autoridade e de papeis não eram claramente delineadas.
O Novo Terreno: evitando a terapia com drogas
A ênfase de Soteria na possibilidade de crescimento da psicose, embora estivesse firmemente baseada nas teorias que haviam sido articuladas por Laing e Menninger, levou à criação de um ambiente organizado muito original. Soteria tinha poucos precedentes estabelecidos para ser seguidos quando passavam da teoria para a prática. Embora o modelo médico houvesse demonstrado valor heurístico, a sua aplicação aos transtornos psiquiátricos havia tido desafortunadas (e não intencionais) consequências para os pacientes individualmente. Soteria não propôs algumum modelo alternativo da época; porque nenhum deles parecia explicar a (s) condição (s) etiquetada de ‘esquizofrenia’. Ao invés disso, Soteria trabalhou a partir de uma atitude, posição ou visão. A abordagem endossou uma abordagem interpessoal fenomenológica para a ‘esquizofrenia’, na medida em que a equipe tentava tanto entender como dividir a experiência psicótica da pessoa – sem julgar, rotular, derrogar ou invalidar.
Por causa do seu desenho experimental, os clientes de Soteria não recebiam as drogas antipsicóticas disponíveis (neurolépticos, tranquilizantes maiores) tais como Torazina, Haldol, Prolixin ou Stelazine (haviam 18 no mercado no começo dos anos 1970) durante as suas primeiras seis semanas na residência.
A razão principal para esse intervalo era para permitir um teste honesto da abordagem psicossocial de Soteria. A equipe acreditava que poderia demorar seis semanas antes que importantes relações pudessem ser formadas e antes que qualidades especiais da cultura pudessem ser transmitidas significativamente. Durante as seis semanas o progresso do cliente era avaliado, e se nenhuma melhora ocorresse, e se o residente, a equipe e o psiquiatra consultor todos concordassem, um ensaio clínico com tratamento psicofarmacológico geralmente era iniciado. Na medida em que algumas drogas antipsicóticas estavam bem-estabelecidas como eficazes para o tratamento dos sintomas psicóticos, deixar o paciente indefinidamente de fora do tratamento com as drogas poderia ser não-ético.
Durante as seis semanas da investigação do tratamento ‘sem drogas’ o uso de antipsicóticos era permitido:
- Se acreditassem que as drogas poderiam dominar a violência sem controle ou impulsos suicidas que de outra forma não fosse possível manejar;
- Se o residente estivesse com uma dor psíquica insuportável que não pudesse ser aliviada por meios interpessoais;
- O residente solicitasse remédios para ajuda-lo/ajuda-la a se reorganizar.
O limitado uso de drogas antipsicóticas na Casa Soteria contrasta com o fato que quase que todos os sujeitos tratados nas enfermarias dos hospitais psiquiátricos ou gerais, bem como nos Centros de Saúde Mental, que serviram como unidades assistenciais para o estudo comparativo, todos recebiam neurolépticos durante toda a sua permanência.
Começamos o novo século, estamos em 2017, e apesar do acúmulo das evidências científicas a questionar o uso indiscriminado e massivo de antipsicóticos, ainda nos comportamos como se a ciência confirmasse a eficácia e a segurança do tratamento com antipsicóticos. Já em 1979, a Organização Mundial da Saúde (OMS), em um estudo sobre os resultados com o tratamento da ‘esquizofrenia’, mostrava a correlação entre a baixa confiança na medicação com antipsicóticos e recuperação, concordando com o que vinha sendo demonstrado em Soteria. Enquanto que mais do que ¾ dos indivíduos de sociedades do terceiro-mundo diagnosticados como “esquizofrênicos” estiveram ou recuperados ou levando suas vidas de um modo relativamente saudável após cinco anos do seu diagnóstico, apenas 25 %, quer dizer, ¼ de tais pacientes em países ricos desfrutavam um nível similar de sucesso. Uma segunda investigação da OMS, feita porque pesquisadores desacreditavam os resultados, dizendo que eles contrariavam o esperado, concluiu os mesmos achados [4] [5].
A propósito, destaco essa longa citação do que Mosher disse em 1979:
Nós vivemos em uma cultura sobre-medicada, muito frequentemente dependente de drogas, apesar da ambivalência resolvida ao se criar duas categorias de drogas: as boas, como álcool, e as más, como o LSD. A atitude da Psiquiatria não é diferente do que aquela do contexto social mais amplo: nós ainda estamos procurando por uma resposta mágica de uma pílula. As drogas antipsicóticas têm posto nas mãos dos psiquiatras uma substância real para a fantasia deles de cura mágica aplicada à esquizofrenia. Mas, como costuma ocorrer com a maioria das expectativas exageradas, a fantasia é melhor do que a realidade. Após duas décadas, está agora claro que as drogas antipsicóticas não curam a esquizofrenia. Está também claro que elas têm sérias, algumas vezes toxicidades irreversíveis (…) que a recuperação possa ficar prejudicada por elas, pelo menos para alguns esquizofrênicos (…) e que elas têm pouco efeito em longo-prazo no ajustamento psicossocial (…) Essas críticas não negam a sua extraordinária ajuda na redução e controle de sintomas, diminuindo o tempo de internação, e revitalizando o interesse na esquizofrenia. Uma das metas do projeto Soteria é procurar uma alternativa viável bem informada com relação ao uso exagerado dessas drogas e a excessiva confiança nessas drogas, com frequência excluindo as medidas psicossociais. Nós usamos raramente drogas e, quando prescritas, elas estão primariamente sob o controle individual do residente (do paciente). Quer dizer, a ela/ele é solicitado que monitore cuidadosamente as suas respostas à droga para nos dar um feedback, para que assim nós possamos ajustar a dosagem, e , após um período de ensaio de duas semanas, a ele/ela é dado o papel principal de determinar se ele/ela irá continuar a usar as drogas. – Mosher & Menn, 1979, p. 73 –
Muitos artigos escritos por Mosher e colegas com os resultados da experiência foram publicados, recomendo que pelo menos este aqui seja lido.
E para se conhecer melhor toda a fascinante história de Soteria, recomendo este livro aqui. E Loren Mosher, explicando o paradigma Soteria. Clique aqui.
Referências bibliográficas:
[i] Jenner, FA, Monteiro ACD, Zagalo-Cardoso JA, Cunha-Oliveira JA. Schizophernia: a disease or some ways of being human? Sheffield, UK: Sheffield University Press, 1993.
[2] Mosher, I. R. (1972). Research design to evaluate psychosocial treatments of schizophrenia. In D. Rubinstein & Y. O. Alanen (Eds.), Psychotherapy of Schizophrenia, (251-260). Amsterdam: Excerpta Medica Foundation.
[3] Mosher, I. R., Menn, A. Z. & Matthews, S. M. (1975). Soteria: Evaluation of a home-based treatment for schizophrenia. Americans Journal of Orthopsychiatry, 45 (3): 455-467.
[4] Jablenski, A. (1992). Schizophrenia: manifestations, incidence, and course in different cultures: a World Health Organization ten-country study. Psychological Medicine, Suppl. 20, 1-95.
[5] Leff, J. (1992). The international pilot study of schizophrenia”: five-year follow-up findings. Psychological Medicine, 22, 131-145.
[6] Mosher, L. R., & Menn, A. Z. (1979). Soteria: An Alternative to hospitalization for schizophrenia. New Directions for Mental Health Services, I, 73-83.
Fonte: http://madinbrasil.org/2017/10/experiencias-alternativas-ao-modelo-biomedico-da-medicina-mental/